Edição I - Legado e Patrimônio Cultural 
 1. Introdução
 
 A partir de hoje,  trarei informações acerca do Patrimônio Cultural de nossa cidade, semanalmente, numa série de artigos.
 
 O objetivo é elucidar dúvidas, bem como, informar acerca das ações pertinentes ao nosso Patrimônio Cultural.
 
 
 2. Legado
 
 Todos os dias nós assumimos o papel de sermos alguém na multidão.  Dormimos. Acordamos. Fazemos nossa higiene. Alimentamo-nos e alimentamos  alguém. Saímos de casa para trabalhar, estudar, rezar ou até mesmo  passear. Por que fazemos tudo isso? De quem herdamos isso? A resposta é:  tudo isso faz parte da nossa cultura.
 
 Durante nossa caminhada do dia-a-dia, deparamo-nos com o nosso passado e  muitas vezes nem o percebemos. A rotina do nosso dia-a-dia é um  ensinamento que foi transmitido a nós pelos nossos antepassados. Você já  parou para pensar que tudo que você é e será, produz e produzirá é  fruto da experiência transmitida pela sociedade a você?
 
 Tudo isso é fruto da experiência humana e sendo a nossa cultura nos fornece a direção do fazer, do pensar e do sentir.
 
 Ao propor a preservação do patrimônio cultural de nossa sociedade,  está se propondo o resgate de uma memória viva, protegida por  instrumentos legais que farão à valorização e o reconhecimento da nossa  cultura.
 
 O nosso patrimônio cultural é o conjunto dos bens protegidos e  constituídos, principalmente, de edificações e de coisas que podem ser  guardadas e assim protegidas e restauradas. Estes fazem parte do  patrimônio cultural material, pois, eterniza em suas formas e elementos  decorativos o costume, o senso de beleza, o espírito do lugar, a  identidade e as características vivenciadas em uma época.
 
 Mas, não podemos esquecer as tradições, os ensinamentos transmitidos de  geração para geração, os erros e acertos de nossos antepassados, o nosso  comportamento, a forma de interagir e a forma que manifestamos nossa  liberdade de expressão, pois estes estão diretamente ligados ao nosso  lugar e é o que diferencia uma sociedade de outra, tornando assim, nosso  patrimônio cultural imaterial.
 
 O pão é pão em todo lugar, porém a forma de se fazer e a utilização dos  ingredientes imprimirão a ele um sabor típico característico da cultura  de cada sociedade.
 
 Escrever a linha do tempo tendo a história como testemunha do  passado, exemplo do presente e advertência para o futuro é reconhecer em  nós mesmos a nossa herança cultural sustentável. 
 
 "A cultura é aquilo que permanece no homem quando ele já esqueceu todo o resto.” (Émile Henriot)
 
 3. Patrimônio Cultural
 
 Para se chegar a uma definição de patrimônio cultural, é necessário  entender, historicamente, as ações que desencadearam o aparecimento  deste termo.
 
 Em 1837 em Paris, na França, foi criada uma comissão encarregada de  preservar os monumentos históricos da cidade. O arquiteto Eugène  Emannuel Viollet-le-Duc, que fez parte dessa comissão, foi um dos  principais estudiosos a pensar no tema. Os estudos começaram por  estabelecer princípios de intervenção em monumentos históricos e uma  metodologia de restauração dos mesmos. A restauração era considerada  como uma ciência na época devido à grande influência que se firmava na  Europa pelo Iluminismo, a Revolução Francesa e Revolução Industrial -  movimentos estes que geraram uma ruptura com o passado, motivando o  estabelecimento de uma identidade nacional pelo sentimento de proteção  aos bens históricos.
 
 Viollet-le-Duc[¹] era reconhecido  pelos trabalhos práticos de restauração, passou a ser notado pelas suas  obras teóricas que discorria sobre o papel do arquiteto e suas condições  de trabalho, detalhava sobre técnicas de entalhe de pedra e rejunte,  além de formas de levantamento, verificação e análise de patologias e  indicação de técnicas de restauro.
 
 No Brasil, o interesse pelo tema, oficialmente surgiu na Semana de Arte  Moderna de 1922 com Mário de Andrade. Em 1934 foi criada a Inspetoria de  Monumentos Nacionais que executava o serviço de restauro de monumentos  históricos e que atuava principalmente na cidade de Ouro Preto, a qual  foi tombada por este mesmo órgão, neste mesmo ano. Em 1936, o então  Ministro da Educação e Saúde Gustavo Capanema solicitou a Mário de  Andrade preparar um projeto de lei para a criação de uma instituição  nacional de proteção do patrimônio. Esse documento foi o embrião usado  nas discussões preliminares sobre a estrutura e os objetivos do SPHAN -  Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, criado em janeiro  de 1937 e regulamentado por decreto presidencial assinado em 30 de  novembro de 1937, por Getúlio Vargas.
 
 Após todo esse período de descobertas da necessidade de se garantir a  preservação dos bens de valor histórico e artístico de nosso país, houve  desdobramentos para definir quais seriam estes bens e como  conceituá-los.
 
 Em 1946 a Constituição Federal, no seu Art. 175 traz a primeira  referência oficial sobre a proteção do patrimônio histórico e artístico  nacional: 
“Art.  175 - As obras, monumentos e documentos de valor histórico e artístico,  bem como os monumentos naturais, as paisagens e os locais dotados de  particular beleza ficam sob a proteção do Poder Público.”
A Convenção[²]  para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural, adota em 16  de novembro de 1972, durante a Conferência Geral da UNESCO, os seguintes  conceitos para:
 
 “Os monumentos – Obras arquitetônicas, de escultura ou de pintura  monumentais, elementos de estruturas de caráter arqueológico,  inscrições, grutas e grupos de elementos com valor universal excepcional  do ponto de vista da história, da arte ou da ciência; 
 
 Os conjuntos – Grupos de construções isoladas ou reunidos que, em  virtude da sua arquitetura, unidade ou integração na paisagem tem valor  universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da  ciência; 
 
 Os locais de interesse – Obras do homem, ou obras conjugadas do  homem e da natureza, e as zonas, incluindo os locais de interesse  arqueológico, com um valor universal excepcional do ponto de vista  histórico, estético, etnológico ou antropológico.”
 
 A Constituição Federal do Brasil de 1988, vigente até os dias de hoje,  traz no seu Art. 216 a definição dos bens que constituem o nosso  patrimônio cultural:
 
 “Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza  material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto,  portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes  grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
 
 I - as formas de expressão;
 II - os modos de criar, fazer e viver;
 III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
 IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;
 V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,  artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.”
 
 Há vários conceitos sobre Patrimônio Cultural, a destacar:
 “Patrimônio Cultural é o conjunto de todos os bens, materiais ou  imateriais, que, pelo seu valor próprio, devam ser considerados de  interesse relevante para a permanência e a identidade da cultura de um  povo. O patrimônio é a nossa herança do passado, com que vivemos hoje, e  que passamos às gerações vindouras”. [Wikipédia, a enciclopédia livre.]
 
 “Patrimônio Cultural é a soma dos bens culturais de um povo, que são  portadores de valores que podem ser legados a gerações futuras. São o  que lhe confere identidade e orientação, pressupostos básicos para que  se reconheça como comunidade, inspirando valores ligados à pátria, à  ética e à solidariedade e estimulando o exercício da cidadania, através  de um profundo senso de lugar e de continuidade histórica”. [Instituto  Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – IEPHA/MG]
 
 Mais recentemente, o conceito de Patrimônio Cultural se desdobra em Patrimonio Cultural Imaterial definido da seguinte forma:
 
 “Patrimônio Cultural Imaterial são as práticas, representações,  expressões, conhecimentos e técnicas - junto com os instrumentos,  objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados - que as  comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como  parte integrante de seu patrimônio cultural." [UNESCO]
 
 “Patrimônio cultural imaterial é uma concepção de patrimônio cultural  que abrange as expressões culturais e as tradições que um grupo de  indivíduos preservam em respeito da sua ancestralidade, para as gerações  futuras. São exemplos de patrimônio imaterial: os saberes, os modos de  fazer, as formas de expressão, celebrações e os lugares, as festas e  danças populares, lendas, músicas, costumes e as mais variadas  tradições”. [Wikipédia, a enciclopédia livre.]
 
 A definição de Patrimônio Cultural representa toda a produção de um  povo que é compartilhada e transmitida de geração a geração, seja ela  material ou imaterial em todas as suas formas de expressão tangíveis ou  não, isoladas ou em conjunto e que constituem as refêrencias que  identificam uma sociedade ao seu lugar.
 
 Texto e pesquisa:
Alessandre Humberto de Campos
arquiteto e urbanista
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[¹]  Eugène-Emmanuel Viollet-le-Duc (1814 - 1879) - Restaurador de monumentos  francês nascido em Paris, arquiteto ligado ao revivalismo arquitetônico  do século XIX e um dos primeiros teóricos da preservação do patrimônio  histórico, foi um dos responsáveis pelo reconhecimento do gótico como  uma das mais importantes etapas da história da arte ocidental.
 [²]  Elaborada na Conferencia Geral da Organização das Nações Unidas para  Educação, a Ciência e a Cultura, reunida em Paris de 17 de outubro a 21  de novembro de 1972.
Agradecemos ao arquiteto e urbanista ALESSANDRE HUMBERTO DE CAMPOS, especialista em reabilitação ambiental sustentável, arquitetônica e urbanística pela FAU/UnB, pela autorização para republicar o texto que está disponível neste endereço:
Olhar urbano: Edição I - Legado e Patrimônio Cultural: